Dan Houser, um dos nomes por trás de Grand Theft Auto e ex-figura central da Rockstar Games, fez uma comparação nada delicada ao falar sobre o rumo que a inteligência artificial pode tomar.
Durante uma entrevista ao Chris Evans Breakfast Show, na Virgin Radio UK, ele disse que a IA está caminhando para devorar a si mesma, algo que, para ele, lembra o surto de vaca louca no Reino Unido, quando bovinos foram alimentados com restos de outros bovinos contaminados.
A imagem é perturbadora, mas sintetiza bem sua preocupação: modelos de IA são treinados com dados da internet, e a internet está sendo rapidamente inundada por conteúdo criado pela própria IA. Em algum momento, esse ciclo pode se tornar autodestrutivo.
O alerta de Houser soa especialmente irônico em um momento em que a indústria de games vive uma onda de demissões enquanto executivos abraçam a IA como solução mágica.
Tim Sweeney, CEO da Epic Games, é um dos mais entusiasmados, chegando até a criticar publicamente a Steam por marcar jogos que utilizam IA em sua produção.
A promessa que acompanha esse movimento é sedutora: mundos mais vivos, narrativas dinâmicas e desenvolvimento acelerado.
Mas ainda é incerto se o resultado será tão revolucionário quanto muitos vendem, ou se veremos o contrário, com jogos sem alma, cheios de personagens artificiais estranhos e ambientes que parecem montados por um robô apressado.
A inquietação de Houser se aproxima de duas ideias que vêm ganhando tração online: a teoria da “internet morta”, que sugere que grande parte do conteúdo já é gerada por bots, e o chamado “colapso de modelo”, quando algoritmos treinados em dados artificiais começam a degradar.
No fim das contas, ele teme uma internet que se deteriora por dentro, semelhante ao que acontece com uma vaca infectada pela doença que inspirou sua metáfora.
E o problema nem fica só no campo da qualidade. Há também as implicações éticas e legais de integrar inteligência artificial de forma profunda nos games.
Já vimos casos de chatbots incentivando comportamentos perigosos no mundo real, algo que parece ficção científica, mas já ocorreu várias vezes com sistemas acessíveis ao público.
Curiosamente, Strauss Zelnick, CEO da Take-Two Interactive, empresa-mãe da Rockstar, disse no ano passado que não acredita que a IA vá baratear produção, acelerar processos ou garantir hits.
Para ele, a tecnologia é apenas uma ferramenta, e a criatividade continua sendo humana. É uma visão que se conecta com a de Houser, mesmo que este esteja mais preocupado com um futuro distorcido por conteúdos gerados em série.
Houser admite que sua nova empresa, a Absurd Ventures, também experimenta com IA, mas com cautela. Ele lembra que a tecnologia ainda está longe de entregar o que suas defensoras mais entusiasmadas prometem.
No fim das contas, a mensagem do criador de GTA é simples: a IA pode ser útil, mas não resolve tudo. E se o setor não pensar com cuidado sobre como está alimentando esses modelos, talvez acabe repetindo a mesma tragédia que a agricultura britânica viveu décadas atrás.
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